Putin revisa doutrina nuclear e amplia condições para uso de armas nucleares

O presidente russo, Vladimir Putin, revisou nesta terça-feira os critérios para um ataque nuclear, reduzindo o limite de resposta para incluir uma gama mais ampla de ataques convencionais. A decisão ocorre poucos dias após relatos de que a Casa Branca permitiu que a Ucrânia disparasse mísseis americanos em território russo.

A Rússia alertou o Ocidente durante meses de que, caso Washington permitisse que a Ucrânia utilizasse mísseis de fabricação americana, britânica ou francesa contra alvos dentro da Rússia, Moscou consideraria esses membros da OTAN diretamente envolvidos na guerra.

A doutrina nuclear atualizada, que define os parâmetros sob os quais Putin poderia ordenar um ataque do maior arsenal nuclear do mundo, foi aprovada nesta terça-feira, segundo um decreto publicado.

Analistas destacam que a principal mudança permite que a Rússia considere um ataque nuclear em resposta a um ataque convencional contra a Rússia ou Belarus que represente uma “ameaça crítica à sua soberania ou integridade territorial”.

“O panorama geral mostra que a Rússia está reduzindo o limite para um ataque nuclear em resposta a possíveis ataques convencionais”, afirmou Alexander Graef, pesquisador do Instituto de Pesquisa para a Paz e Política de Segurança da Universidade de Hamburgo.

Anteriormente, a doutrina de 2020 previa o uso de armas nucleares apenas em caso de ataque nuclear inimigo ou de uma ameaça à existência do Estado russo.

BAIXO LIMITE

Em uma clara referência à Ucrânia e aos Estados Unidos, a nova doutrina estipula que qualquer ataque de uma potência não nuclear apoiada por uma potência nuclear será considerado um ataque conjunto. Além disso, um ataque de qualquer membro de um bloco militar será tratado como um ataque da aliança inteira.

Relatos na mídia ucraniana sugerem que um míssil ATACMS dos EUA foi disparado em território russo pela primeira vez. A Reuters não conseguiu confirmar imediatamente essas informações. O Kremlin afirmou que as forças russas estão monitorando a situação de perto.

No milésimo dia da guerra na Ucrânia, a Rússia também ampliou a definição de dados que poderiam indicar um ataque em massa, incluindo aeronaves, mísseis de cruzeiro e drones.

O conflito está entrando no que autoridades russas e ocidentais consideram uma fase final — e potencialmente mais perigosa. Moscou avança em seu ritmo mais rápido desde as primeiras semanas do confronto, enquanto o Ocidente debate o desfecho da guerra.

Juntas, Rússia e Estados Unidos controlam 88% das ogivas nucleares do mundo. Putin é a principal autoridade para decidir sobre o uso do arsenal russo.

Ativos considerados seguros, como títulos do governo, o iene japonês e o ouro, tiveram alta acentuada após a publicação da nova doutrina.

GUERRA

Diplomatas russos comparam a crise atual à Crise dos Mísseis de Cuba em 1962, alertando que o Ocidente comete um erro grave ao subestimar a disposição da Rússia em escalar o conflito.

O Kremlin reafirmou que as armas nucleares são vistas como meios de dissuasão e que o objetivo do novo texto é esclarecer a inevitabilidade de retaliação em caso de agressão contra a Rússia ou seus aliados.

“O perigo de um confronto direto entre potências nucleares não pode ser subestimado. Estamos navegando por um território militar e político desconhecido”, disse Sergei Ryabkov, vice-ministro das Relações Exteriores da Rússia.

As principais mudanças na doutrina haviam sido indicadas por Putin em setembro. Analistas interpretaram na época que as alterações buscavam traçar uma linha vermelha clara para o Ocidente.

Questionado sobre a ligação do decreto com a decisão da Casa Branca de permitir ataques ucranianos em solo russo, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, declarou que a publicação ocorreu em momento “oportuno”.

“A dissuasão nuclear busca garantir que qualquer adversário potencial compreenda a inevitabilidade de retaliação em caso de agressão contra a Federação Russa e/ou seus aliados”, afirmou Peskov.

Em 2022, os Estados Unidos demonstraram grande preocupação com o possível uso de armas nucleares táticas pela Rússia, alertando Putin sobre as consequências desse ato, segundo o diretor da CIA, Bill Burns.

Matéria publicada pela Reuters no dia 19/11/2024, às 09h21 (horário de Brasília)