Bancos estrangeiros projetam dólar acima de R$ 6,00 em 2025 diante de incertezas fiscais
O movimento relevante de piora do câmbio doméstico nas últimas semanas já começa a se refletir em uma piora nas expectativas para o real também em horizontes mais distantes. A Pesquisa Focus, que já aponta o dólar a R$ 5,77 no fim de 2025, é uma amostra da deterioração das expectativas, em um processo que começa a se mostrar ainda mais intenso nas projeções de bancos estrangeiros, cujas estimativas apontam para uma moeda americana que se mantém na casa de R$ 6 e que pode chegar a níveis ainda mais altos a depender da condução da política fiscal.
No acumulado do ano, o dólar já registrou alta de aproximadamente 24% contra o real, o que torna a moeda brasileira a de segundo pior desempenho do ano quando comparada a todas as divisas mais líquidas. E embora o dólar já tenha alcançado máximas históricas neste ano e ultrapassado o nível de R$ 6, a chance de a moeda bater novos recordes continua a rondar o mercado e se torna o cenário base de alguns bancos.
É o caso do Morgan Stanley, que projeta o dólar a R$ 6,30 no segundo semestre de 2025 e vê o nível de R$ 5,40 como “piso”. A chefe de estratégia para América Latina do banco, Ioana Zamfir, avalia inclusive que, na ausência de medidas fiscais que gerem um alívio na preocupação com a trajetória da dívida, “mais prêmios de risco podem ser precificados”. Em um cenário de dominância fiscal, o Morgan acredita que o dólar poderia chegar ao nível de R$ 6,70 a R$ 7,00.
“Até agora, o real não conseguiu responder aos contínuos aumento de juros”, diz Zamfir. “Tomando o período de 2015 como ponto de referência para uma perspectiva ‘bear’ [de desvalorização] que poderia ser precificada num cenário de dominância fiscal, chegamos à leitura de que os preços podem sofrer mais ajustes [de queda]”, aponta o banco. Naquele momento, lembra a estrategista, o real chegou a ficar 30% mais barato, na relação da moeda frente a uma cesta de divisas adotada pelo banco. Agora, porém, o real ficou apenas 10% mais barato nessa comparação.
Caso a moeda brasileira deprecie ainda mais frente a essa cesta de divisas, indo aos níveis observados em 2015, “seria consistente o dólar atingir algo entre R$ 6,70 e R$ 7,00, sendo níveis que sugerem que os riscos de dominância fiscal estão largamente precificados”. “No entanto, avaliamos que isso seria equivalente a uma queda acentuada na confiança dos investidores, e que um anúncio fiscal favorável poderia tornar-se mais suscetível de acontecer para impedir tal deterioração”, diz o banco.
Já no final de outubro, o Wells Fargo via um cenário desafiador para os mercados emergentes, mencionando “projeções sombrias” para economias mais sensíveis à China. No caso específico do Brasil, a perspectiva era ainda pior devido à incerteza fiscal. De lá para cá, houve uma deterioração adicional nas perspectivas do banco. Se no fim de outubro a projeção indicava o dólar a R$ 6,30 em 2025, agora a perspectiva é de que a moeda chegue a R$ 6,80.
“Com o tempo, à medida que as métricas fiscais pioram e o risco político se intensifica, acreditamos que o real estabelecerá consistentemente novos mínimos em relação ao dólar americano”, dizem os economistas Nick Bennenbroek, Brendan McKenna e Anna Stein, em relatório mensal. “Na nossa opinião, a deterioração fiscal e o elevado risco político podem fazer com que a taxa de câmbio atinja R$ 7 por dólar até o primeiro trimestre de 2026.”
Os estrategistas do Deutsche Bank também se tornaram mais pessimistas em relação ao real, justamente por uma visão negativa quanto aos desdobramentos recentes da política fiscal, que devem ser “dominantes no futuro próximo” na dinâmica da moeda brasileira e, portanto, se sobressair a fatores que, em tese, apoiariam a moeda, como a Selic em 14% ou mais; uma pequena contração no déficit em conta corrente; e um posicionamento técnico leve.
“O atual governo revelou a preferência por mais gastos em detrimento da estabilidade econômica”, avaliam os estrategistas do banco alemão, que projetam o dólar a R$ 6,00 no fim de 2025 e a R$ 6,50 no fim de 2026. O Deutsche não descarta ainda a chance de que a moeda alcance R$ 7,00 em caso de choques.
Vale notar que, mesmo entre os bancos estrangeiros menos agressivos, a deterioração nas perspectivas para o câmbio é evidente. Se no começo de julho o nível de R$ 5,70 do dólar provocou um mal-estar em Brasília que, na sequência, levou a um anúncio de congelamento de despesas pelo governo, agora esse nível está em algumas das projeções mais otimistas do mercado para o nível do câmbio no próximo ano.
O Citi tem sido um dos poucos bancos estrangeiros com visão mais otimista em relação ao câmbio. Sobre o efeito de variáveis externas e globais, o banco diz ver o cenário mais neutro no próximo ano, se comparado às condições atuais. “Mas nos últimos meses, em especial nas últimas semanas, o câmbio tem sido bastante afetado por questões domésticas”, observa o economista-chefe para Brasil do banco, Leonardo Porto.
“Ainda que o nível de incertezas seja gigante neste momento, estamos assumindo, como cenário mais provável, que uma parte grande desse ruído que surgiu após a divulgação do pacote fiscal vai ser reduzido ao longo do ano que vem. E ao ser reduzido, com cenário global relativamente neutro, nós vemos um câmbio em torno de R$ 5,70”, afirmou Porto ao participar de evento do banco sobre as perspectivas para 2025.
Recentemente, estrategistas do Citi abriram posição comprada em real contra uma cesta que engloba dólar e euro. “Embora haja prêmio nos juros e no câmbio, vemos espaço para o real se estabilizar à medida que avançamos para o primeiro trimestre de 2025”, dizem os profissionais em nota enviada a clientes.
Matéria publicada pelo Valor Econômico no dia 11/12/2024, às 14h02 (horário de Brasília)