Ação relâmpago da Ucrânia em Kursk desafia liderança de Putin e altera curso do conflito

A intervenção relâmpago da Ucrânia em território russo mostra que uma guerra aparentemente presa em um impasse prolongado ainda pode produzir surpresas. Mais de uma semana após o início do ataque na região ocidental de Kursk, na Rússia, as tropas ucranianas pareciam estar mantendo as áreas que haviam conquistado. Isso é um constrangimento para o presidente russo Vladimir Putin, que, tendo falhado em derrubar a liderança em Kyiv após mais de dois anos de combates intensos, agora enfrenta a primeira invasão estrangeira em seu país desde a Segunda Guerra Mundial.

Por que a Ucrânia lançou a incursão na Rússia?

O presidente ucraniano Volodymyr Zelenskiy vinha procurando lançar um ataque que chocasse a liderança em Moscou e colocasse Putin em uma posição difícil, segundo um oficial ocidental familiarizado com o planejamento. Se a Rússia não conseguir repelir os ucranianos, isso elevará o moral em Kyiv e ajudará a proteger partes da Ucrânia dos bombardeios constantes da Rússia. Isso também poderá potencialmente enfraquecer o avanço das tropas russas na região de Donetsk, mais ao sul, forçando a liderança militar do Kremlin a enviar tropas e recursos para conter a incursão. As forças ucranianas também afirmam ter capturado muitos soldados russos que podem ser trocados por seus próprios soldados em futuras trocas de prisioneiros.

Ucrânia diz que operações continuam na região de Kursk, na Rússia

O que a liderança da Ucrânia disse sobre isso?

Zelenskiy levou quase uma semana para confirmar publicamente a operação militar, que ele chamou de “questão puramente defensiva”, sem revelar detalhes de seu plano de longo prazo. Ele traçou um paralelo com o desastroso naufrágio do submarino nuclear russo Kursk nos primeiros meses da presidência de Putin em 2000, dizendo que os eventos na região de Kursk inaugurariam o período final do governo do líder russo.

Então, como está indo?

A situação permanece fluida, sem uma linha de frente clara, e ambos os exércitos focados em atacar seus oponentes onde os encontram. Unidades de reconhecimento ucranianas ainda estavam realizando incursões em território russo na região. A Ucrânia afirma ter capturado cerca de 1.000 quilômetros quadrados (386 milhas quadradas), enquanto a Rússia anunciou anteriormente a perda de uma área com aproximadamente metade desse tamanho. As tropas ucranianas pareciam estar no controle de uma instalação de medição de gás ao longo de um gasoduto estratégico de trânsito que abastece a Europa Ocidental. O gás ainda estava fluindo através do gasoduto, por enquanto.

Como os russos responderam?

As tropas russas ainda não cumpriram a ordem de Putin para expulsar o inimigo e garantir a fronteira. As autoridades em Moscou declararam uma emergência federal na região de Kursk, e o governador local disse que um sexto de sua população fugiu das áreas afetadas pelos combates. O Serviço Federal de Segurança da Rússia também anunciou um regime de “contraterrorismo” em Kursk e nas regiões vizinhas de Belgorod e Bryansk, uma medida que permite restrições ao movimento e às comunicações. Embora o exército russo tenha enviado reforços, não reduziu sua ofensiva no leste da Ucrânia e intensificou seu bombardeio das áreas fronteiriças.

O que dizem os aliados da Ucrânia?

Os parceiros ocidentais da Ucrânia, incluindo os EUA e a União Europeia, não se opuseram à operação em Kursk, reservando-se a avaliar suas chances de sucesso. O Pentágono disse que as ações da Ucrânia são consistentes com a política dos EUA sobre o uso de armas fornecidas pelos americanos, uma vez que o país está se defendendo de ataques vindos do outro lado da fronteira. Um membro do comitê de defesa na câmara baixa do parlamento da Alemanha, Markus Faber, disse que a falha de liderança por parte dos militares russos em Kursk colocou a Ucrânia em uma posição favorável e pediu mais ajuda para apoiar um avanço ucraniano.

O que isso significa para a guerra?

A falta de uma resposta imediata e contundente da Rússia à captura de seu território levanta questões sobre a capacidade do Kremlin de impor suas próprias linhas vermelhas. Isso também pode encorajar os doadores ocidentais de Kyiv a permitir que a Ucrânia finalmente ataque alvos dentro da Rússia usando as armas de longo alcance que eles doaram. Até agora, o exército ucraniano foi obrigado a limitar o uso de armas como o míssil superfície-superfície ATACMS dos EUA para atacar alvos em território ucraniano capturado pela Rússia.

Embora o território russo sob controle de Kyiv seja relativamente pequeno por enquanto, ele oferece uma nova carta nas potenciais futuras negociações de paz, supondo que o exército consiga manter suas conquistas. Mas a ação em Kursk também pode sobrecarregar o exército ucraniano se muitos de seus soldados mais experientes forem desviados de outras linhas de frente.

A retaliação de Moscou pode estar a caminho. A ausência de grandes ataques de mísseis por mais de um mês é um possível sinal de que a Rússia está acumulando armas para um novo grande ataque.

Matéria publicada pela Bloomberg no dia 13/08/2024, às 12h39 (horário de Brasília)