As distribuidoras estão cobrando demais? A Raion Consultoria mostra os componentes dos preços finais da gasolina e do diesel.

Em um evento promovido pela Petrobras no Terminal da Baía de Ilha Grande (Tebig), no dia 17 de fevereiro, em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, o Presidente Lula declarou que Petrobras deveria cortar a intermediação das distribuidoras e vender o diesel e a gasolina diretamente para o consumidor final a fim de baratear o custo dos combustíveis.

— A Petrobras tem que tomar uma atitude. A gente precisa vender diesel para os grandes consumidores direto, se puder comprar direto, para que a gente possa baratear o preço do diesel. Se a gente puder vender gasolina direto, se puder vender gás direto… porque o povo, no fundo, é assaltado pelo intermediário. E a fama fica com o governo — disse Lula

A fala do presidente gerou grande repercussão na mídia e foi recebida com críticas por parte de players do mercado de combustíveis, sobretudo pelas distribuidoras.

Em nota, a Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis) entidade que reúne 34 sindicatos patronais e representa os interesses de cerca de 45 mil postos de combustíveis no país, declarou “ser imprescindível manter a sociedade informada para que a revenda não seja responsabilizada pelos altos custos dos combustíveis no país”, ressaltando que “a gasolina que sai das refinarias é pura e ainda não está pronta para o consumo final”.

A Raion Consultoria destrinchou os elementos que compõe os preços para o consumidor final do diesel e da gasolina. Confira abaixo:

Fonte: ANP, Cepea/USP e Petrobras
Base de atualização: 14/02/2025
Fonte: ANP, Cepea/USP e Petrobras
Base de atualização: 14/02/2025

Os dados demonstram que 45,0% do preço final da gasolina é composto pela parcela da estatal e impostos federais e, no caso do diesel, a parcela é de 55,0%.

Quanto representa cada componente

  • Parcela Petrobras

A parcela da estatal representa 35,0% do preço da gasolina e 50,1% do preço do diesel.

  • Impostos federais

Correspondem aos impostos federais o PIS (Programa de Integração Social, destinado a trabalhadores da iniciativa privada) / Pasep (Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público, destinado a servidores públicos), Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social, que visa financiar a previdência, a assistência social e a saúde) e Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, tributo que incide sobre a importação e comercialização de petróleo, gás natural e álcool etílico).

Os impostos federais representam 11,3% do preço da gasolina e 5,0% do preço do diesel.

  • Imposto estadual

Corresponde ao imposto estadual o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Em fevereiro, o tributo sofreu um aumento de R$ 0,10 por litro, na gasolina, e R$ 0,06 por litro, no diesel.

O ICMS representa 23,1% do preço da gasolina e 17,3% do preço do diesel.

  • Mistura de biocombustíveis

A partir de outubro de 2024, foi instaurada a lei Nº 14.993, também conhecida como Lei do Combustível do Futuro. A legislação alterou os limites máximo e mínimo do teor de mistura de etanol anidro à gasolina C, comercializada ao consumidor final, e de biodiesel ao diesel, comercializado ao consumidor final.

Sendo assim, tanto a gasolina quanto o diesel deverão ter incrementos progressivamente maiores de seus respectivos biocombustíveis até o ano de 2030, até chegar entre 22% e 35%, no caso da gasolina, e 20%, no caso do diesel.

A mistura dos biocombustíveis representa 13,8% do preço da gasolina e 12,8% do preço do diesel.

  • Distribuição e revenda

A distribuição e revenda representa 16,9% do preço da gasolina e 14,8% do preço do diesel.

O que pesa mais no preço dos combustíveis?

Atualmente, o preço final do diesel e da gasolina é composto por diferentes fatores: custos de produção e importação, tributos federais e estaduais, margens de lucro de distribuidores e revendedores, além dos custos logísticos.

De acordo com dados do setor, os tributos representam uma parcela significativa do preço dos combustíveis, variando conforme o estado e a alíquota aplicada. A participação das distribuidoras, por sua vez, é proporcionalmente menor, mas sua função vai além da precificação: elas desempenham um papel essencial na logística de distribuição em um país de dimensões continentais como o Brasil.

Com base nos dados, a equipe de inteligência de mercado da Raion Consultoria calculou o preço final dos combustíveis em dois cenários: caso a Petrobras realizasse a venda diretamente ao consumidor final, sem a participação das distribuidoras, e caso não houvesse impostos estaduais e federais embutidos no preço final dos produtos.

Considerando a média Brasil, no primeiro cenário, ao retirarmos a participação das distribuidoras na precificação do produto, o preço da gasolina nas bombas seria de R$ 5,30, ao invés de R$ 6,37, enquanto o preço do diesel nas bombas seria de R$ 5,52, ao invés de R$ 6,47.

Considerando a média Brasil, no segundo cenário, ao retiramos as tributações estaduais e federais, o preço da gasolina nas bombas seria de R$ 4,18, ao invés de R$ 6,37, e o preço do diesel nas bombas seria de R$ 5,03, ao invés de R$ 6,47.

O corte da participação das distribuidoras representaria uma redução nos preços finais da gasolina e do diesel de R$ 1,07 e R$ 0,95, respectivamente. Enquanto a eliminação da tributação representaria uma redução nos preços finais da gasolina e do diesel de R$ 2,19 e R$ 1,44, respectivamente.

Problemas logísticos

A retirada das distribuidoras da cadeia de abastecimento exigiria que a Petrobras assumisse toda a operação logística, o que traria uma série de desafios. Atualmente, as distribuidoras são responsáveis pelo armazenamento, transporte e distribuição dos combustíveis das refinarias e terminais até os postos. Sem elas, a Petrobras teria que investir pesadamente em infraestrutura de armazenagem e frota própria para atender a demanda nacional, algo que poderia gerar gargalos operacionais e elevar custos.

Outro ponto crítico é a capilaridade. As distribuidoras possuem bases em diversas regiões do país, garantindo abastecimento regular até mesmo em locais mais remotos. Sem essa intermediação, o transporte se tornaria mais complexo e poderia comprometer o fornecimento a postos menores e independentes, que não teriam estrutura para retirar combustível diretamente dos terminais. Atualmente, a infraestrutura de distribuição de combustíveis no Brasil é composta por 343 bases autorizadas, segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP). Já a Petrobras opera com apenas 11 refinarias, sendo que apenas 9 delas produzem gasolina e óleo diesel atualmente. Isso significa dizer que cada refinaria precisaria realizar o abastecimento equivalente a aproximadamente 40 bases de distribuição.

Desafio ainda maior para algumas regiões

A situação se tornaria ainda mais crítica em estados mais distantes dos grandes polos de refino. O Amazonas, por exemplo, depende fortemente da distribuição fluvial para receber combustíveis. Manaus, sua capital, está localizada a mais de 5000 km da refinaria produtora de óleo diesel e gasolina mais próxima, em Pernambuco, tornando inviável qualquer modelo que exigisse abastecimento direto. Sem as distribuidoras, seria necessário desenvolver uma nova infraestrutura logística para conectar refinarias a mercados distantes, algo que demandaria investimentos bilionários e prazos longos para implementação.

Além disso, a ausência das distribuidoras comprometeria o abastecimento de postos menores e independentes, que não possuem estrutura para buscar combustível diretamente nas refinarias ou terminais. Esse efeito seria sentido de forma desigual pelo país, com impactos mais severos nas regiões Norte e Nordeste, onde as distâncias são maiores e a logística de transporte mais complexa.

Visão da Raion Consultoria

Diante do exposto, considerando os fatores econômicos, fiscais, logísticos e regulatórios, a Raion Consultoria avalia que a proposta do presidente Lula de permitir a venda direta de combustíveis das refinarias da Petrobras para o consumidor final não se sustenta como uma solução viável.

Embora a medida possa sugerir um alívio econômico imediato, os desafios operacionais e logísticos envolvidos superariam qualquer potencial redução de preços. A retirada das distribuidoras exigiria um redesenho completo da infraestrutura de abastecimento, com investimentos bilionários e um período de transição longo e complexo.

Além disso, a mudança poderia resultar em impactos assimétricos pelo país, com regiões isoladas, como o Norte e Nordeste, enfrentando maiores dificuldades no fornecimento. Isso poderia levar esses mercados a dependerem ainda mais de combustíveis importados, tornando o abastecimento mais caro e suscetível à volatilidade externa.

Por fim, se a intenção for reduzir o custo dos combustíveis para o consumidor final, o caminho mais eficaz e menos oneroso seria a revisão da carga tributária incidente sobre esses produtos. Medidas como a simplificação do ICMS e a redução de tributos federais teriam um impacto direto nos preços, sem comprometer a estrutura logística que garante o abastecimento nacional.

Matéria de autoria da equipe de comunicação da Raion Consultoria