Chefe da cúpula climática da ONU defende expansão do petróleo da Petrobras
O chefe da cúpula climática da ONU no Brasil defendeu a produção de petróleo e gás como compatível com os esforços internacionais para limitar o aquecimento global, antes de o país sul-americano sediar as negociações climáticas mais importantes do mundo.
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer que o Brasil se torne o quarto maior produtor de petróleo do mundo. O país sediou no mês passado um leilão de blocos de petróleo, incluindo alguns no mar próximo à foz do rio Amazonas.
Quase 200 países concordaram em abandonar os combustíveis fósseis até 2050 na cúpula climática COP28 da ONU em Dubai em 2023. O progresso nas metas climáticas nacionais será avaliado na próxima COP30 da ONU em novembro, já que o mundo continua fora do caminho da necessidade de reduzir os gases de efeito estufa pela metade até 2030, em relação aos níveis de 1990, para limitar o aquecimento global a 1,5 °C desde os tempos pré-industriais.
André Corrêa do Lago, presidente designado da cúpula climática COP30 da ONU, que acontece na cidade amazônica de Belém, minimizou as preocupações de que a posição do Brasil sobre a expansão do petróleo esteja em conflito com os esforços globais para atingir emissões líquidas zero.
“Estamos pensando em um ‘net zero’ que incorpore alguns anos de uso contínuo de petróleo. A transição [dos combustíveis fósseis] permite uma flexibilidade considerável”, disse o diplomata sênior ao Financial Times.
“Acredito que todos os países estão analisando como podem atingir o net zero de uma forma que seja economicamente viável, tecnologicamente viável, e que logicamente deva ir na direção da transição para longe [dos combustíveis fósseis].”
Até 2030, a Petrobras , empresa estatal brasileira de combustíveis fósseis, aumentará a produção de petróleo entre os maiores produtores do mundo em termos percentuais, de acordo com uma nova análise do grupo de campanha Global Witness com base em dados de março da consultoria independente Rystad Energy.
A grande empresa de petróleo e gás, controlada pelo governo brasileiro, está a caminho de produzir um bilhão de barris de petróleo em 2030, ou um terço a mais do que produziu em 2024, segundo a pesquisa.
A Petrobras não quis comentar. Seus dados públicos mostram que a produção de petróleo e gás foi equivalente a 2,7 milhões de barris por dia em 2024 e aumentaria para 3,2 milhões de bpd até 2029, embora esse aumento de 19% em relação aos 33% do estudo não seja diretamente comparável, visto que os números abrangem petróleo e gás.
O pesquisador da Global Witness, Patrick Galey, disse que sua pesquisa se concentrou apenas no petróleo porque as emissões de dióxido de carbono resultantes de seu uso eram mais poluentes por um período mais longo, durando centenas de anos na atmosfera.
O analista da Rystad, Flávio Menten, disse que a Petrobras não estava adotando uma estratégia muito diferente de suas concorrentes multinacionais e que, após 2031, o grupo de pesquisa previu um declínio constante na produção do Brasil.
Pouco mais da metade do petróleo do Brasil é exportado, enquanto a rede elétrica do país é amplamente abastecida por energia hidrelétrica e eólica.
O governo brasileiro argumenta que parte dos recursos provenientes da exportação de hidrocarbonetos pode ser destinada a investimentos em fontes de energia mais sustentáveis. O Ministério de Minas e Energia afirmou que a transição foi compatível com suas necessidades econômicas e sociais.
O processo de transição não foi “algo radical”, disse o ministério, e foi importante equilibrar o fortalecimento das fontes de energia renováveis com a exploração e produção de petróleo e gás “que ainda serão necessárias para as matrizes nacionais nas próximas décadas”.
Corrêa do Lago afirmou que muitos países, incluindo os EUA e a Noruega, também estão expandindo a produção de petróleo. O acordo da COP28 para a transição dos combustíveis fósseis “permite que países e empresas escolham caminhos diferentes”, observou.
Ele argumentou que se o Brasil aumentasse sua produção de petróleo, mas usasse os lucros para proteger a Amazônia do desmatamento, isso seria “completamente diferente” de um cenário em que o país aumentasse a produção de combustíveis fósseis e reduzisse as energias renováveis.
Alguns países, disse ele, não tinham outra escolha atualmente a não ser usar suas reservas de combustíveis fósseis para ajudar a pagar por seu desenvolvimento econômico. Mas já havia sinais de afastamento dos combustíveis fósseis por parte das principais economias, como o aumento da eletrificação na China, acrescentou.
A cúpula deste ano se concentrará nos esforços para implementar os acordos já feitos em cúpulas climáticas anteriores da ONU, ele observou, incluindo a eliminação gradual dos combustíveis fósseis. No entanto, ativistas como Galey acusam o Brasil de um “conflito de interesses” ao tentar equilibrar seu papel como anfitrião da cúpula climática da ONU ao mesmo tempo em que expande a produção de petróleo.
A indústria petrolífera demonstrou “domínio sobre todo o processo da COP”, disse Galey, ao frustrar os esforços para combater as mudanças climáticas nas cúpulas mais recentes da ONU realizadas nos petroestados dos Emirados Árabes Unidos e do Azerbaijão.
Na Conferência Global Tipping Points e no Fórum Climático de Exeter, no Reino Unido, esta semana, envolvendo centenas de delegados de importantes organizações científicas e acadêmicas europeias, quase 200 participantes endossaram uma declaração pedindo ação dos formuladores de políticas, “especialmente [os] líderes reunidos na cúpula climática COP30 no Brasil ainda este ano”.
Matéria publicada no Financial Times, dia 04/07/2025, às 03:36 (horário de Brasília)