Como a eleição presidencial dos EUA impacta o preço dos combustíveis no Brasil?
As eleições presidenciais dos Estados Unidos estão se aproximando, e com elas a atenção do mundo se volta para as implicações econômicas globais que podem surgir a partir dos resultados. Pesquisa recente do New York Times indica uma corrida acirrada entre os principais candidatos, Kamala Harris (partido Democrata) e Donald Trump (partido Republicano), com os dois empatados tecnicamente em intenção de votos. Esse cenário de incerteza política reflete diretamente no mercado financeiro, influenciando o câmbio (Dólar/Real) e os preços das cotações internacionais do petróleo.
Investidores e analistas de mercado observam com cautela as chamadas “Trump Trades”, apostas financeiras que se baseiam na expectativa de retorno de políticas econômicas associadas ao ex-presidente Trump. Essas especulações têm causado oscilações significativas nos mercados globais, afetando não apenas o valor do dólar em relação ao real, mas também as estratégias de investimento em commodities como o petróleo.
Flutuações no Câmbio e Impactos sobre o Real
A incerteza política nos EUA afeta diretamente os mercados globais, e os investidores demonstram cautela à medida que as eleições se aproximam. Um cenário de vitória republicana pode sinalizar instabilidade nas relações comerciais, levando os mercados a buscarem ativos considerados mais seguros. Isso implica em um aumento da aversão ao risco, refletido no preço de commodities e em mercados emergentes como o Brasil.
A possibilidade de vitória de Trump, conhecido por suas políticas protecionistas e postura mais rígida em relação ao comércio global, desperta preocupações entre economistas e investidores. A volta de um “Trump trade” indica que uma nova administração republicana poderia impulsionar o dólar devido a possíveis tarifas e tensões comerciais com a China, caso já visto em destaque no primeiro governo de Trump, quando impôs tarifas a importações de vários países, incluindo a China, em 2018. Isso poderia impactar diretamente a precificação do real, aumentando a volatilidade do câmbio e pressionando o custo de importação de produtos e insumos para o Brasil. Em contrapartida, Harris tende a seguir uma linha diplomática mais próxima da atual, o que poderia suavizar as tensões comerciais, e manteria o dólar em níveis mais contidos.
No curto prazo, a eleição de Kamala Harris poderia levar a uma valorização do dólar em relação ao real, já que a expectativa de novos gastos governamentais e programas de infraestrutura pode levar a um aumento nas taxas de juros, em um esforço do Federal Reserve (Fed), banco central norte-americano, para controlar a inflação. Esse cenário fortalece a moeda americana, tornando o real mais fraco em comparação devido a redução do diferencial de juros entre a Selic e as taxas de juros do Fed, tornando assim, menos atrativo investir em títulos de maior risco no Brasil.
No entanto, em um cenário de médio a longo prazo, assumindo que Harris cumpra as promessas de sua campanha e implemente uma política fiscal expansionista, baseada em aumento dos impostos para as empresas, isso poderia enfraquecer o dólar. Maiores impostos corporativos geraria um potencial fluxo (de investimentos) saindo dos Estados Unidos, migrando esse capital para ações globais e/ou para mercados emergentes, contribuindo para a valorização do real frente o dólar.
Impacto nos preços do barril de Petróleo
Outro fator em jogo é o mercado de petróleo, que responde a políticas energéticas e geopolíticas dos EUA. A eleição de Kamala Harris ou Donald Trump como presidente dos Estados Unidos promete afetar o mercado global de petróleo de maneiras contrastantes. Enquanto Harris defende uma transição energética voltada para fontes renováveis e uma política mais restritiva para combustíveis fósseis e o petróleo de xisto (Shale Oil), Trump se posiciona a favor de incentivos ao setor de petróleo e gás, com políticas voltadas para a autossuficiência energética. Essa diferença é crucial para o futuro da indústria de petróleo: enquanto Harris poderia promover regulamentações mais rígidas e desincentivar a exploração, Trump tende a flexibilizar essas normas, o que poderia manter a produção em alta.
Sob a ótica geopolítica, o próximo presidente dos EUA vai ter que trabalhar em um mundo que enfrenta o maior risco de confronto entre grandes potências desde a Guerra Fria. Enquanto Kamala representaria a continuidade das políticas “conciliadoras” do atual governo de Biden, Trump traria, em tese, mais riscos e incertezas sobre os conflitos no Leste Europeu e no Oriente Médio, tendo em vista, por exemplo, que já indicou que irá interromper o forte apoio militar e econômico à Ucrânia contra a Rússia.
No cenário de uma possível vitória de Harris, espera-se que haja uma pressão sobre a indústria para reduzir a dependência de combustíveis fósseis e, possivelmente, uma desaceleração na produção doméstica de petróleo nos Estados Unidos. Essa perspectiva, somada a eventuais incentivos para a energia limpa, pode levar a uma redução na oferta e, consequentemente, ao aumento dos preços globais do petróleo. No entanto, o fortalecimento de energias renováveis, impulsionado por políticas de transição energética, poderia trazer impactos indiretos ao setor. Isto porque, maiores incentivos para uma matriz mais limpa abrem espaço para uma nova configuração no mercado energético global, incentivando países produtores a buscarem alternativas, levando a uma redução na demanda por combustíveis fósseis, no médio e longo prazo. Consequência disso, pressão baixista sobre os preços do barril, tendo em vista que os EUA são os maiores produtores e consumidores de petróleo global.
Por outro lado, uma vitória de Trump reforçaria uma política de incentivo à exploração e produção doméstica, mantendo o petróleo como uma das principais fontes de energia dos EUA. Seu novo mandato poderia sustentar o preço do petróleo em patamares moderados, impulsionado por uma oferta constante. Essa postura poderia gerar uma recuperação no mercado, beneficiando especialmente países produtores e exportadores de petróleo, como a Arábia Saudita e a Rússia. No entanto, a continuidade de uma alta produção poderia manter o mercado saturado, limitando o crescimento dos preços no médio prazo e potencialmente dificultando os avanços globais em sustentabilidade energética.
Além disso, com os Estados Unidos ampliando sua participação no mercado de petróleo, graças ao desenvolvimento da produção doméstica, a eleição de Trump poderia renovar ruídos no relacionamento com países da Opep, especialmente com sua aliada Arábia Saudita, que busca equilibrar a oferta de petróleo e manter os preços em níveis sustentáveis para a organização. Uma postura de estímulo ao crescimento da produção doméstica dos EUA poderia desestabilizar a política de cortes de produção vigente do cartel, dificultando os esforços da Opep em controlar a oferta global e manter os preços em patamares considerados vantajosos para suas economias.
Projeções de entidades financeiras internacionais, como o Banco Mundial e o grupo Julius Baer, apontam que as cotações do barril poderão navegar na faixa entre US$ 65 e US$ 75, fundamentadas nas expectativas de sobreoferta de petróleo no mercado global, limitando os efeitos de uma guerra mais ampla no Oriente Médio sobre os preços.
Preços dos Combustíveis no Brasil
A eleição de Kamala Harris ou Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos pode afetar os preços dos combustíveis no Brasil. As variações no câmbio e nos preços internacionais do petróleo têm reflexo direto no preço nacional dos combustíveis, que ainda depende de importações de derivados, no caso do Diesel são, em média, 25% do volume comercializado, enquanto na gasolina equivale a 10%, em média.
Porém, é importante destacar que a atual política de preços da Petrobras não acompanha as cotações internacionais, com a intenção de evitar o repasse de eventuais volatilidades do mercado internacional. Um exemplo disso, em abril, o barril superou a marca dos US$ 90 devido a tensões geopolíticas no Oriente Médio e, mesmo assim, a Petrobras manteve os preços do óleo diesel nas suas refinarias, permanecendo inalterados desde dezembro de 2023.
Neste cenário pós corrida presidencial, se por um lado não vislumbramos uma pressão altista sobre os preços do petróleo, por outro lado, espera-se a elevação para um novo patamar de desvalorização do real, criando, em tese, um cenário desafiador para a política de preços da Petrobras. No entanto, a tendência é que o impacto sobre os preços dos combustíveis no Brasil seja absorvido pela Petrobras em um primeiro momento, uma vez que a estatal poderia manter os preços sem grandes ajustes devido à política de preços em vigor. Já para a hipótese de um patamar de preços globais sustentado por um tempo prolongado, seja alto ou baixo, acaba por ditar a necessidade de reajustes por conta de possíveis efeitos da transição política nos Estados Unidos.
Em suma, a eleição presidencial de 2024 nos EUA é um evento global que afeta diretamente economias emergentes como o Brasil, seja pelos impactos no câmbio, nos preços do petróleo ou nos investimentos externos. O mercado permanece atento às políticas que serão adotadas pelo próximo presidente dos EUA, seja na área fiscal, comercial ou de investimentos em infraestrutura. Essas políticas terão o poder de moldar não apenas a economia norte-americana, mas também de ditar o ritmo e a direção dos mercados financeiros em todo o mundo.
O desfecho das eleições promete ser um divisor de águas, com potencial para alterar o panorama econômico global e, consequentemente, afetar a vida financeira de milhões de pessoas ao redor do globo, incluindo no Brasil.
Matéria desenvolvida pela Raion Consultoria, no dia 30/10/2024