Guerra comercial: tarifas espantosas de Trump entram em vigor para mais de 90 países

As duras novas tarifas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre mais de 90 países entraram em vigor à meia-noite de quinta-feira (7), dando continuidade à escalada na guerra comercial global que já começa a cobrar seu preço da economia americana.

Poucos dos principais parceiros comerciais dos EUA escaparam das novas alíquotas, que elevaram a tarifa efetiva média norte-americana ao nível mais alto em quase um século. Nas horas que antecederam a aplicação dos tributos, Trump deixou claro que haveria mais por vir, reafirmando sua estratégia que abalou os mercados, elevou preços e causou apreensão entre consumidores e empresas em todo o mundo.

Tarifas contra o Brasil entraram em vigor um dia antes:

A novidade foi anunciada em uma série de decretos assinados na semana passada pelo presidente — alguns formalizaram os acordos preliminares negociados recentemente com a União Europeia e outros países. Trump defende que essas tarifas ajudam a redefinir relações comerciais consideradas injustas, gerar novas receitas para o governo, estimular a indústria nacional e alcançar outras metas.

De fato, as tarifas ajudaram a gerar receita — cerca de US$ 152 bilhões em arrecadação aduaneira até julho, mostram dados recentes —, mas os efeitos adversos também já são visíveis. Um número crescente de empresas alertou que pode não suportar os custos crescentes de componentes importados essenciais.

Como resultado, os preços já começaram a subir. O último indicador mensal de inflação mostrou que eletrodomésticos, roupas e itens de decoração ficaram mais caros em junho. A economia continua crescendo, porém a um ritmo anêmico, com analistas prevendo pouca melhora até o final do ano. O mercado de trabalho também já sente os efeitos, com a contratação desacelerando bruscamente em julho.

Para Olu Sonola, chefe de pesquisa econômica da Fitch Ratings nos EUA, os efeitos das tarifas anunciadas na primavera já começam a aparecer. Com os novos tributos em vigor, afirmou, os americanos verão os impactos se intensificarem nos próximos meses.

As tarifas começam em 15%, aplicadas a importações de países como Bolívia, Equador, Islândia e Nigéria. Outros, como Taiwan, são taxados em 20%. A Argentina e o Brasil também estão na lista com alíquotas ainda maiores: Trump impôs 50% sobre alguns produtos brasileiros, como retaliação à decisão de Brasília de processar Jair Bolsonaro — então aliado político de Trump — por tentar se manter no poder após perder as eleições.

Na quarta-feira (antes da implementação), o presidente anunciou que elevaria as tarifas sobre a Índia para 50% até o fim de agosto, como resposta à compra de petróleo russo por parte do país. Ele também indicou que outros países podem enfrentar sanções semelhantes, como forma de pressionar Rússia a interromper sua guerra contra a Ucrânia.

De modo geral, os tributos não se aplicam a produtos que já estavam em trânsito. Mercadorias embarcadas antes de quinta-feira não serão taxadas, desde que entrem nos EUA até o início de outubro, abrindo espaço para importadores aumentarem seus estoques antes que as alíquotas mais altas afetem seus custos.

Vários países menores já enfrentavam tarifas de 10% desde que Trump anunciou e depois suspendeu a primeira fase de suas políticas em abril. Outros negociaram reservas e agora pagam alíquotas entre 15% e 20%, como a UE (União Europeia), o Japão, a Coreia do Sul e o Vietnã. Esses países se comprometeram a abrir seus mercados aos produtos americanos e, em alguns casos, prometeram investir bilhões nos EUA, mas os termos exatos desses acordos ainda não foram divulgados.

Na sexta-feira, Trump impôs 35% de tarifas sobre produtos canadenses que não estão cobertos pelo Acordo EUA-México-Canadá (USMCA). A aplicação para o Canadá já teve efeito, enquanto tarifas equivalentes destinadas ao México foram suspensas enquanto as negociações continuam. Quanto à China, os tributos permanecem em 30%, conforme o acordo firmado entre os países neste ano — mas a trégua expira nesta terça-feira.

As tarifas de quinta-feira dificilmente serão o capítulo final dessa guerra comercial, que enfrenta diversos desafios legais nos tribunais federais. Trump ainda pretende impor impostos sobre remédios importados, chips e outros produtos estrangeiros.

Na quarta-feira, ele mencionou que as tarifas sobre semicondutores seriam definidas em 100%, embora ainda não tenham sido anunciadas oficialmente. Esse anúncio foi feito ao lado de Tim Cook, CEO da Apple, que prometeu investir mais US$ 100 bilhões nos EUA. Trump indicou que as taxas poderiam ser flexibilizadas para empresas que fabricarem chips de alta tecnologia localmente.

O presidente também minimizou os sinais de impacto negativo em economia, afirmando que “os custos estão muito baixos” e que o país terá um crescimento “sem precedentes”. Ele já havia alegado que os estrangeiros seriam os mais afetados por suas tarifas e, na semana anterior, demitiu o responsável pelo relatório de emprego do governo, ao afirmar sem provas que os dados haviam sido manipulados contra ele.

De acordo com o Budget Lab da Universidade Yale, as novas tarifas elevam a taxa efetiva média dos EUA para mais de 18%, índice não visto desde 1934. Para famílias americanas, isso pode significar um aumento médio de US$ 2.400 nas despesas anuais. Para a economia como um todo, representa redução na produção, com perda de meio ponto percentual no crescimento a partir de 2025.

Para Mark Zandi, economista-chefe da Moody’s Analytics, as tarifas podem criar um ambiente “muito parecido com a estagflação”, ou seja, crescimento lento com alta de preços — o que complicaria ainda mais o trabalho do Federal Reserve, especialmente agora com Trump exigindo cortes na taxa de juros:

“O crescimento está desacelerando. Já está acontecendo e vai se tornar muito mais evidente.”

Até o momento, a economia americana conseguiu evitar as previsões mais sombrias de uma recessão. Mas muitos especialistas afirmam que era apenas questão de tempo até que as tarifas tivessem efeitos reais e perceptíveis — principalmente porque muitas empresas anteciparam compras antes da chegada das alíquotas mais altas.

Matthew Martin, economista sênior da Oxford Economics, explicou que os estoques foram reduzidos desde o primeiro anúncio das tarifas em abril. Com o retorno das alíquotas elevadas, ele disse, os preços tendem a subir novamente:

“Isso vai se acelerar nos próximos meses.”

Matéria publicada no portal InfoMoney, no dia 07/08/2025, às 06:29 (horário de Brasília)