O papel da Opep+ na transição energética global

A Opep enfrenta o maior desafio desde sua criação. O mundo precisa parar de queimar petróleo e limitar o aquecimento global a menos de 2°C, conforme o Acordo de Paris firmado pelas nações sobre as mudanças climáticas. O consenso geral é que o uso de petróleo precisa diminuir em até 80% até a metade do século para que possamos atingir as metas do Acordo de Paris. O impacto de tal queda será devastador para muitos produtores de petróleo.

A Opep deve ajudar seus membros a navegar pelas águas traiçoeiras da transição energética. A organização deve promover o que dois de seus membros ricos, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, já estão fazendo — trabalhar arduamente na diversificação de suas economias.

Esse papel para a Opep não é nada novo. As primeiras ideias políticas do final da década de 1950 que levaram à criação da Opep em 1960 não se baseavam apenas no desejo dos produtores de petróleo de controlar seus próprios recursos naturais. A cooperação econômica, a assistência técnica e uma abordagem unificada para a formulação de políticas energéticas também eram objetivos importantes e iniciais da organização.

O principal objetivo da Opep — libertar os recursos petrolíferos do jugo do oligopólio neocolonial das companhias petrolíferas internacionais — foi alcançado no final da década de 1970. Esta foi uma vitória enorme para os países membros e algo de que devem se orgulhar.

Tendo desfrutado da crescente demanda e dos altos preços da década de 1970, a Opep passou a defender suas receitas econômicas extraordinárias e a apoiar um preço do petróleo bem acima do custo de produção. Em uma conferência em Viena em 1982, a organização concordou em limitar a produção impondo cotas individuais para cada país membro, tornando-se oficialmente um cartel. Desde então, a Opep tem sido geralmente bem-sucedida em manter o preço bem acima do nível de mercado competitivo.

Oficialmente, a Opep aceita a realidade das mudanças climáticas. Mas, na prática, ela se opõe veementemente aos apelos para a eliminação dos combustíveis fósseis. O cartel projeta que a demanda continue crescendo para 116 milhões de barris por dia até 2045 e solicita um aumento nos investimentos para atender a essa demanda. Essas ações são totalmente incompatíveis com os objetivos do Acordo de Paris.

Parece que a Opep está seguindo a estratégia da indústria do tabaco — financiando uma campanha para prolongar a vida útil de seu produto, uma manobra que se tornou conhecida como “atraso predatório”. Ela está estimulando a demanda em países sem políticas adequadas para proteger o meio ambiente. Ao mesmo tempo, a líder da Opep, a Arábia Saudita, parece apoiar a manutenção dos preços do petróleo o mais alto possível, pelo maior tempo possível, enquanto utiliza os rendimentos das altas receitas petrolíferas para diversificar sua economia o mais rápido possível.

Essa estratégia provavelmente não funcionará para vários países da Opep — Nigéria, Venezuela, Congo, Gabão, Argélia e outros. Esses países são altamente vulneráveis à falta de receitas e têm orçamentos governamentais dependentes dos preços do petróleo.

A Opep poderia desempenhar um papel fundamental em ajudá-los a se afastar da dependência das receitas dos combustíveis fósseis e diversificar suas economias para outros setores e fontes de energia mais limpas, muitas vezes abundantes na maioria dos petroestados.

O secretariado da Opep está bem posicionado para desempenhar o papel-chave nesse processo. Tem excelente pessoal e recursos. Em conjunto com outros organismos internacionais, como o FMI e o Banco Mundial, pode aconselhar sobre sustentabilidade aprimorada, caminhos de transição ideais e estabilidade econômica.

Alguns membros, como a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos, já estão envolvidos em projetos ambientais, como a Oil and Gas Climate Initiative, um consórcio de algumas das maiores empresas estatais e multinacionais de petróleo do mundo. Existe também a International Petroleum Industry Environmental Conservation Association, na qual a Abu Dhabi National Oil Company e a Aramco estão envolvidas. E a Aramco aderiu a um programa do Banco Mundial para reduzir a zero a queima — o processo de queima de gás para aliviar a pressão durante a extração de petróleo — até 2030. Mas, em vez de se engajarem individualmente em iniciativas sustentáveis, toda a organização deveria participar.

É hora de a Opep desempenhar um papel positivo. Em vez de ser um obstáculo à transição energética, a Opep poderia ser parte da solução — uma força para o bem, com um legado não apenas de retomar a propriedade de seus recursos do poder neocolonial das grandes petrolíferas, mas também de ajudar seus membros a superar as dificuldades da inevitável transição energética.

Matéria publicada pelo Financial Times no dia 31/07/2024, às 01h14 (horário de Brasília)